Algum Dia Te Disse?

Algum dia te disse
Como é bom segurar-te?
Ainda que m'abstraísse
Augurava apenas tocar-te.

Já mencionei alguma vez
Que deveras sinto falta,
No círculo da tacanhez
Ver uma imagem tão alta?

E mencionei a vertigem
Das coisas mais pequenas?
Elas que são a origem...
De sensações tão terrenas.

Não sei se te roguei
Para lá das cortinas
Tão felpudas, eu ousei
Contemplá-las tão finas.

Algum dia te disse
Qu'o teu espírito encantador
E a tua essência de flor,
Fizeram que emergisse
O meu cariz trovador?

A Casa com Cercas Brancas II

Estamos os dois sentados
C'uma reconfortante bebida
Enrolados numa manta comprida
Juntos, tão aconchegados
Sinto-te por fim, aquecida

Enquanto esticas as pernas
Deslizando-as nas minhas
Até agora sozinhas
Sinto-as tão longas e ternas
Desmesuradamente tenrinhas

Tuas bochechas ruborizadas
Pelo brando lume da lareira
(Que vai engolindo madeira)
Parecem cerejas avermelhadas
(Ou é por estares à minha beira)

Desfias-me os caracóis
Soltando um ou outro riso
Cheiro-te o cabelo quase liso
Puxemos agora os lençóis
E... Voltemos ao paraíso

Deixas-me um beijo breve
No canto da sobrancelha
Deslizando par'a orelha
Mesmo sendo ao de leve
Irradia qual centelha

Acid Rain

© Liquid Tension Experiment

Deixa-me

Deixa-me contar nas entrelinhas
Tudo aquilo que tenho a dizer
Pois as palavras não são sozinhas
Trazem muito mais p'ra entender

Deixa-me dizer de modo vago
Esta história que eu te conto
Pois as palavras são meu afago
E meu silêncio é contraponto

Deixa-me cantar por poesia
Algo que não ouso em prosa
Pois as palavras são ousadia
Perante uma flor tão formosa

Deixa-me, deixa-me apenas falar
Em qualquer direção do vento
Pois as palavras são o luar
As palavras são nosso alento

© Rebelo da Costa